AS MUDANÇAS NOS PROJETOS DE AUTOMAÇÃO EM FUNÇÃO DOS NOVOS PROCESSOS DE MODELAGEM

Autor: Eng. José Roberto Muratori

Está em curso uma mudança de grande porte nos processos que envolvem o desenvolvimento dos projetos da construção civil. A adoção de ferramentas de modelagem (BIM – Building Information Modeling) impacta diretamente tanto na forma de projetar como no posterior controle dos objetos modelados no seu uso e manutenção durante todo ciclo de vida da edificação.

Inicialmente vamos definir o que representa o BIM. Esta ferramenta “envolve a representação de projetos com uma combinação de objetos que levam suas geometrias, relações e atributos a um novo nível de complexidade. O BIM é um processo inteligente com base de dados 3D que equipa os profissionais de arquitetura, engenharia e construção com ferramentas para todas as etapas do projeto, da sua concepção até o projeto executivo e, posteriormente, na construção e gerenciamento de obras, infraestruturas e gestão de empreendimentos mais eficientes”. Portanto, o BIM não é apenas um software, mas é uma ferramenta (ou modelo) digital orientado a objetos, onde estes não são representados apenas pelos seus atributos geométricos, mas também pelos seus parâmetros e atributos intrínsecos.

Quando estas informações são utilizadas por todos os agentes envolvidos no projeto e na operação das edificações pode-se esperar a maior eficiência possível nos processos decisórios. Quando visualizamos alguns projetos executados com o BIM inicialmente podemos nos encantar com as imagens geradas, normalmente em 3D e com um nível de detalhes nunca antes percebido. No entanto não é esta a característica mais marcante do BIM, mas o que ele representa no gerenciamento e manuseio das informações.

E talvez seja este o maior obstáculo à utilização mais ampla da ferramenta na construção civil, pois hoje os agentes envolvidos ainda estão mais focados na “construção” e na “edificação” propriamente dita em detrimento da “informação” que ela gera. Como se percebe, o impacto desta ferramenta será extensivo a todas as disciplinas envolvidas na construção e no uso das edificações.

Projetos de arquitetura e de estrutura inicialmente são as vertentes mais visíveis e trazem os benefícios mais evidentes na constatação e solução de interferências entre projetos. Mas, como isto será propagado para as demais disciplinas? A atividade de coordenação de projeto assumirá um papel ainda mais importante não somente no que tange à compatibilização, mas também se estendendo à inter-relação de todos os sistemas, representados pelos seus objetos e suas propriedades. A coordenação vai se preocupar em estudar não somente a qualidade do modelo adotado, mas também terá que testar a sua consistência e a sua conformidade para somente então validá-lo.

E no caso especifico de projetos de automação predial? Muitos proprietários de edifícios e gerentes de instalações não têm hoje uma boa documentação para seus sistemas de controle de automação. A documentação tem um grande valor; a falta dela pode ter um custo elevado além de aumentar o seu risco. Falta de documentação significa que a solução de problemas e as ordens de serviço demoram mais tempo, são mais caras e transferem problemas para seus usuários. Também pode significar que a manutenção preventiva não é feita porque o gestor não conhece o desempenho esperado de um equipamento o que, possivelmente, também vai encurtar a sua vida útil. Ou pode significar que o pessoal que fez a instalação original realmente conhecia bem sobre seus sistemas, mas se eles se mudaram ou se aposentaram e todo esse conhecimento ou "documentação do sistema" é levada com eles.

Essa falta de documentação para os sistemas de automação e controle é causada pela organização e planejamento inadequados na transferência entre as fases de projeto e da construção para as operações da edificação e o fato de que grande parte da documentação está em um formato ineficiente. Este panorama pode mudar com o uso do BIM. Pois, como vimos, a modelagem inicia desde os primeiros conceitos do projeto e se estende a todo ciclo de vida da edificação. A modelagem de sistemas de automação envolve o desenvolvimento de uma IFC (Industry Foundation Class) específica para automação e controle. Um IFC é um modelo de dados aberto e neutro que descreve os dados da indústria de construção para facilitar a interoperabilidade dos dados entre projetistas, empreiteiros e os futuros gestores da instalação. Durante a fase de projeto, quando diferentes elementos de projeto estão sendo determinados, a troca de dados entre os sistemas de automação e de controle devem ser integrados com outros elementos de projeto, como o de instalações elétricas, climatização e hidráulica, entre outros. Objetos (e seus respectivos modelos) no domínio dos sistemas de automação são controladores, sensores, atuadores, alarmes e instrumentos. Os elementos de controle incluem painéis e indicadores.

Neste ponto devemos lembrar que, diferente dos projetos atuais, as definições dos modelos, tais como seus endereços, configurações, conexões, desempenho e tipos de componentes já fazem parte intrínseca desta etapa de projeto e nele estão contidas. Portanto sua integração pode ser simulada e avaliada neste momento. Ou seja, muito antes do que acontece nos dias de hoje e que normalmente torna a instalação, os testes e o comissionamento dos sistemas uma tarefa árdua e custosa. Sem falar do retrabalho que acaba emergindo nesta etapa de entrega.

Baseado na informação anterior, podemos inferir que o BIM pode ser usado também nesta fase para auxiliar na geração de quantitativos e estimativos de custo ao longo da vida de uma edificação. Pois o preço de cada item também é uma característica típica e, se adicionada na modelagem, permite que a equipe analise o impacto nos custos futuros, devido às mudanças em especificações, durante todas as fases do empreendimento. Além da orçamentação, se o modelo implantado na fase de concepção estiver completo, será possível levantar outras simulações de grande valia, como por exemplo, aquelas ligadas ao desempenho energético da edificação e à avaliação do atendimento dos requisitos dos selos de sustentabilidade como LEED, Aqua e BREEAM. Como os sistemas de automação podem contribuir enfaticamente com a aquisição destes selos, a simulação prévia do seu funcionamento e desempenho vai demonstrar se a edificação conseguirá atender os requisitos pré-estabelecidos. Uma típica simulação deste tipo vai analisar, por exemplo, o uso de energia no edifício em função de:

 Condicionamento de Ar e ventilação
 Aquecimento pelo sol
 Número de ocupantes e suas atividades
 Dispositivos de sombreamento
 Níveis de iluminação natural x artificial
 Equipamentos (computadores, copiadoras, impressoras...)

E então estabelecer parâmetros de desempenho desejáveis, ou obrigatórios, conforme o caso. Este parece ser um caminho sem volta, pelo menos é o que se percebe entre especialistas consultados e nos eventos (cada vez mais frequentes) onde o tema é discutido. No entanto, quais seriam então as principais dificuldades para que a modelagem de projetos caminhe a passos largos? Em primeiro lugar, mais uma vez, está a falta de conhecimento e de capacitação de toda uma classe de projetistas, consultores e demais personagens deste ecossistema.

Ainda assim, havendo um esforço intenso na formação e aprimoramento deste público surge um segundo obstáculo: a própria indústria ainda caminha lentamente no fornecimento das bibliotecas que atendam estas novas exigências da modelagem. No caso da indústria de automação o impacto é grande. Pois, diferente de fornecer uma simples biblioteca de legendas com informações básicas como dimensões e diagramas de ligação, as novas ferramentas de modelagem vão solicitar um numero bem maior e mais detalhado de informações sobre cada elemento incluído num projeto. E isto vai exigir uma grande pró-atividade da indústria em proporcionar estes elementos aos projetistas.

Por ultimo, mas não menos importante, está o aspecto da exigência por parte dos contratantes em receber seus projetos neste tipo de modelagem. O governo de alguns países têm se destacado neste quesito, começando a impor o BIM como padrão na contratação de seus projetos. No Reino Unido, na Holanda e em diversos países nórdicos o padrão já é obrigatório em prédios públicos. Em Cingapura o governo oferece incentivos para a sua adoção. Normalmente, as iniciativas partem de áreas ligadas ao governo. No Brasil, estas são oriundas, entre outros, do Exercito Brasileiro e do Governo do Estado de Santa Catarina, os exemplos mais destacados até o momento. Vamos então acompanhar os próximos passos e os desdobramentos deste processo entre nós! ---------------------------------------------------------------------------------------